A história e a arquitetura de Burkina Faso são duas coisas profundamente vinculadas à paisagem natural deste pequeno país da África Ocidental. Geograficamente, Burkina Faso ocupa um extenso planalto com savanas e algumas florestas esparsas. Mais de dois terços da população ainda vive em comunidades rurais e, como tal, a arquitetura contemporânea burquinense é o produto da engenhosidade do seu povo, desenvolvida através da apropriação de sistemas construtivos e materiais locais ao longo do tempo.
Antiga colônia francesa, Burkina Faso conquistou a sua independência em 1960 como République de Halte-Volta devido a posição geográfica do país, banhado pela parte alta do grande rio Volta. O nome Burkina Faso, que significa "Terra de Pessoas Incorruptíveis", foi adotado em 1984, isso porque a capital do país, Ouagadougou, está localizada no centro do país, muito distante dos vales do rio Volta. Esta região, chamada de Sahel, caracteriza-se por variações climáticas muito radicais, desde periodos extremamente secos até grandes e recorrentes inundações. Como resposta, floresceu neste país uma arquitetura resiliente, responsiva e profundamente conectada às características físicas e climáticas deste território.
Burkina Faso é conhecida por ser a terra do premiado arquiteto Diébédo Francis Kéré, nascido em Gando, no centro-leste do país. O arquiteto burquinense, formado pela Universidade Técnica de Berlim, fundou em 2005 o escritório Kéré Architecture com o qual desenvolveu uma série de projetos de arquitetura em sua terra natal, chamando a atenção da comunidade internacional pelo uso inovador de materiais locais. Utilizando painéis metálicos corrugados e substituindo o concreto por tijolos de barro fabricados no local, seus projetos encontram profunda ressonância na paisagem natural e no clima burquinense. Este pioneirismo passou a influenciar decisivamente o trabalho de outros importantes arquitetos como o catalão Albert Faus e o escritório italiano FAREStudio, os quais tem trabalhado com certa frequência no país de Kéré, desenvolvendo uma arquitetura profundamente enraizada na cultura do país e inerentemente dependente de materiais e técnicas construtivas locais. A seleção de projetos, que será apresentada a seguir, nos mostra como esses arquitetos tem desenvolvido diferentes abordagens a partir da fusão entre novas tecnologias e sistemas construtivos tradicionais, reinterpretando e reconstruindo a história da arquitetura burquinense.
Escola Secundária Lycee Schorge / Kéré Architecture
Localizada na terceira maior cidade de Burkina Faso, a Escola Secundária Lycée Schorge foi projetada para estabelecer novos padrões de excelência educacional na região, além de servir como um modelo inspirador para futuros projetos sociais sustentáveis, utilizando materiais locais de forma inovadora. O projeto é composto por nove módulos que acomodam uma série de salas de aula e espaços administrativos. Um dos módulos ainda abriga uma clínica odontológica para atender aos alunos e a comunidade local. A sua arquitetura não se revela apenas como um marco de referência na paisagem, ela também é a melhor prova de que combinando materiais locais, criatividade e trabalho em equipe, é possível construir edifícios duradouros e que possam transformar as vidas das pessoas.
Casa Kisito / Albert Faus
CASA KISITO é um centro de acolhimento para bebês e crianças de até dois anos em espera de adoção. A edificação preexistente, que estava no limite de sua capacidade, era composta por um volume central e dois volumes laterais localizadas na porção leste do terreno. A nova construção toma uma parcela sensivelmente centrada em relação ao espaço vazio restante, paralela à fachada do corpo principal do edifício existente, e seguindo um eixo definido pela potente referência visual que representa o tanque de água elevado. A área resultante entre as duas construções foi transformada em praça de acesso, um espaço reservado para a recepção e acolhimento dos visitantes, assim como um futuro playground para as crianças à sombra das mangueiras.
Centro de Saúde da Mulher / FARE
O projeto do Centro de Saúde da Mulher em Burkina Faso foi idealizado pela AIDOS, uma ONG italiana que luta pelos direitos das mulheres em países em desenvolvimento. O programa do edifício desenvolvido pela AIDOS em conjunto com parceiros locais, está fundamentalmente voltado à prestação de serviços sociais e de saúde à população rural da periferia da capital burquinense Ouagadougou. Para isso, o FAREStudio foi contratado para desenvolver um projeto de revitalização de um complexo de edifícios existentes, adaptando-os para melhor receber uma variedade de novos usos e atividades. Concluído em tempo recorde e em apenas quinze meses de obra por um construtor local e sob a supervisão direta do FAREstudio, o Centro de Saúde da Mulher de Burkina Faso é uma resposta direta, prática e funcional, às necessidades expressas pela AIDOS, um edifício que não apenas serve a sua função, mas que também se transformou em um novo centro social para a população local.
Escola Primária em Gando / Kéré Architecture
O projeto da Escola Primária evoluiu a partir de uma longa lista de parâmetros, incluindo custos, clima, disponibilidade de recursos e viabilidade de construção. O sucesso do projeto se baseou em adotar e negar essas restrições ao mesmo tempo. Para otimizar os resultados com os mínimos recursos disponíveis, uma construção híbrida de argila e lama foi levantada primeiramente. A argila é abundante na região e é tradicionalmente utilizada na construção de moradias. Esta tradicional técnica construtiva em barro foi modificada e modernizada para criar uma construção mais robusta estruturalmente, utilizando tijolos fabricados no local. Os tijolos de argila têm a vantagem adicional de serem baratos, fáceis de produzir e também fornecem proteção térmica contra o clima quente burquinense.
Centro de Integração Escolar, Profissional e Esportiva / Albert Faus
Rimkieta é um dos novos bairros da capital emergidos nos últimos anos para absorver o forte crescimento demográfico assim como a migração do campo para a cidade. Um entorno pouco consolidado e com deficiência em serviços básicos como eletricidade, água ou saneamento. Nossos vizinhos imediatos eram, por um lado, a imponente creche Maternelle Valencia e, por outro, dispersas construções feitas em blocos de cimento as quais nunca se sabe se estão em construção ou sendo derrubadas. Finalmente, o projeto do Centro de Integração Escolar, Profissional e Esportiva se materializa em um edifício adicional de 145 m2 e mais 215 m2 de espaços interiores, além da construção de um muro de proteção no terreno. Os arquitetos mantiveram o projeto clássico das salas de aula, com paredes divisórias sobre um espaço avarandado, construindo uma série de divisórias com tijolos de solo compactado. A fachada consolidou a presença do edifício frente à rua, liberando o espaço do pátio para uma futura expansão que atualmente é utilizada para a prática de atividades esportivas e complementares.